A sociedade
ao que parece tem banalizado os seus templos.
Chego a
acreditar que há uma espécie de vulgarização e banalização do sentido das
coisas a serem contempladas.
Num olhar despretensioso
vejo, ao longo do tempo, a decadência dos grandes templos gregos e dos cultos às
divindades “elementais e superiores” (de qualquer forma exterior, distante e em
uma posição hierárquica maior que o homem), é sensível a decadência cada vez
maior e progressiva da forma como a igreja católica toma conta dos seus templos
(estes ainda cheios de pompa, mas em franca decadência – ao que parece). Seguindo
na linha da desvalorização física, real e concreta do lugar do culto, vejo a emergência
pentecostal e junto com ela a banalização do lugar do contato dos fiéis com a religião,
não há mais o templo construído para o culto, no lugar disto há a adaptação dos
locais comerciais a essa nova forma de estabelecer as relações dos humanos com
a sua fé.
Há uma “comercialização”
das religiões? Não saberia responder, mas o que me assusta mais é que com esse
movimento de banalizar a relação dos homens com seus deuses, parece-me que
estes se tornaram cada vez mais antropomórficos, perderam o status de seres
superiores e agora residem na terra, melhor ainda, residem em cada um de nós,
eles não são mais nem antropomórficos, eles agora são o próprio homem, só que não
é qualquer um que tem acesso a eles, o acesso a estes novos deuses percorre um
caminho muito longo, de grande devoção e de muito sacrifício, como tem que ser
toda relação com a divindade, não?
...esses novos
deuses estão fragmentados, mas eles têm um líder, o corpo, o novo deus é o
corpo e as divindades são as cápsulas, pílulas, complementos, suplementos e
equipamentos que deixam esse deus forte e valente... Foram criados centros,
ainda que banalizados, para a devoção a esse novo Olimpo, as academias de ginástica!
...e a fé nestes deuses está levando a montagem de um exercito. ...são atletas
do corpo, claro... Não precisam ser atletas para mais nada, o novo deus todo
poderoso “corpo” não requer finalidade exterior, apenas fidelidade com a forma,
ele tem que emergir belo, sem dobras, rígido, esbelto, potente... Quanto mais
preparado, mais próximo de atingir o nível nirvana... Todos agora treinam para
ser atletas ou servir ao exercito deste novo deus, claro, só pode ser isso... As
pessoas não se exercitam para sentir o prazer de realizar uma atividade física,
elas treinam, treinam e treinam. Pedalam, correm, levantam peso, praticam
lutas, etc., só podem estar se preparando para uma guerra em nome do “deus
corpo”. Não podem perder tempo, os fiéis deste novo deus se comunicam pela
forma, ah e como eles são “endógenos”, na sua maioria só se relacionam com os
que professam a mesma fé, seria a emergência de uma nova raça pura construída pela
fé ao “deus corpo” e todas as divindades correlatas? Também não saberia dizer,
mas esse “deus corpo” parece ser muito exigente, ele quer encontrar
meios de fazer com que os seus seguidores não mais enfraqueçam. Ficar velho é a
prova que se está perdendo o poder e a divindade? Ficar fraco seria abominável para
essa nova legião de seguidores... Mas o “deus corpo é efêmero”, ele passa, ele
perde potência para o seu maior inimigo, o deus do Tempo... Por isso os fiéis
do corpo querem descobrir um jeito de enganar Cronos. Acho que desta angustia é
que se banaliza e vulgariza o lugar do culto, em todo lugar há um novo templo, às
vezes a dois quarteirões da casa dos fiéis... Seria este o recurso para não abandonar
este deus emergente? E quando for impossível segui-lo? Todos esses fiéis
mudaram de religião?
Acho que não
vivo o meu tempo, talvez seja mesmo anacrônico, mas não quero servir a esse
novo deus...