terça-feira, 12 de junho de 2012

...no final do espetáculo a lembrança marcada nas paredes e no chão da casa que há poucas horas estava cheia, as luzes agora estão apagadas. No camarim, das 14 lâmpadas de vapor de mercúrio apenas 3 funcionam. No espelho, refletida ao fundo, a roupa lembrava o glamour da noite, mas em primeiro plano só era possível ver manchas borradas no rosto do artista, maquiagem que se esvaia arrastada pela força do suor, um olhar triste e melancólico lembrava que algo diferente e muito maior que o sucesso do palco o tirava dos aplausos e o jogava para o fundo de si mesmo, solitário em meio a tantos e tão desejosos, ele só queria sentir o calor gostoso do abraço que o apertava contra o peito e o protegia de tudo, de todos, de si mesmo... de repente a saudade o fez lembrar que mesmo distante ele não estava só, lá, quase a 3.000 quilômetros de onde estava, ele estaria seguro, aqueles braços, aquele peito, aquele carinho, aquele desejo... não só o sentimento, mas também a casa, não só a casa, mas as coisas que se realizavam lá e a mistura da memória entre cheiros, gostos e imagem o fazia ter certeza que mesmo depois de tantos desencontros, lá era o seu lugar, ao menos era lá que ele queria estar, entre máscaras de vudus, entre fridas e khalos, cama de mola, cheiro de ovo frito com verdura, gosto de iogurte, som de ventilador... tudo aquilo se juntava e formava a paisagem em 14"... só com a velocidade possível empreendida pelo desejo e memória, ele estava em pé naquela sala, em frente ao sofá e era lá que ele queria estar, porque diante de tudo que se apresentava, era o único lugar que ele queria estar...